Necessidades femininas relacionadas ao planejamento familiar: metassíntese

Abstract

Introdução: O desenvolvimento das ações de planejamento familiar representa uma das metas a serem atingidas para garantir, no mundo até 2015, o acesso universal à saúde reprodutiva. Apesar do aumento na utilização de métodos contraceptivos, a ocorrência de necessidades insatisfeitas (gravidez indesejada e aborto inseguro) indica a importância de ampliar o diálogo para que usuários do planejamento possam tomar decisões informadas neste campo. Objetivo: Compreender as necessidades femininas relacionadas à atenção ao planejamento familiar. Método: Metassíntese fundamentada na meta-etnografia de Noblit e Hare, na qual em todas as etapas se adotou a triangulação de revisores para ampliar e aprofundar a compreensão do objeto. Os critérios de inclusão dos artigos foram: (a) investigar a perspectiva de mulheres com idade igual ou maior do que 18 anos; (b) constituir-se como estudos originais que utilizaram, exclusivamente, métodos qualitativos; (c) terem sido publicados em inglês, espanhol e/ou português entre janeiro de 2000 e dezembro de 2014 e (d) obedecer aos critérios de qualidade adotados neste estudo. Excluíram-se os estudos relativos à contracepção de emergência, puerpério imediato, mulheres vivendo com HIV/AIDS, usuárias de drogas e doentes mentais. A pesquisa bibliográfica foi realizada em seis bases eletrônicas, utilizando os descritores "family planning" (OR) “family planning services” (OR) “reproductive health” (OR) “reproductive behavior” (OR) "women's health services", combinados (AND) com “perception”, “attitude”, "qualitative research” e “health services needs and demand”. Identificaram-se 1.311 artigos, restando 11 para avaliação da qualidade, utilizando o Consolidated criteria for reporting qualitative research (COREQ), sendo selecionados nove artigos para a síntese final. Os conceitos foram identificados mediante análise temática. Cinco temas-chave foram desenvolvidos dos construtos de primeira ordem: acesso sociocultural, acesso geográfico, acesso econômico, acesso organizacional e qualidade da atenção. Afora o acesso geográfico que não foi abordado pelos autores dos artigos, os temas primários coincidiram com os secundários. A síntese foi construída como uma “linha de argumentos” constituída por seis construtos de terceira ordem: contexto sociocultural, acessibilidade, disponibilidade, adequação funcional, capacidade de compra, adequação técnica e relacional. A submissão ao Comitê de Ética em Pesquisa ocorreu quando da elaboração dos projetos relacionados aos artigos originais. Resultados: Os estudos foram realizados na Ásia, América do Norte, Euro-Ásia e Oriente Médio. Predominaram as mulheres entre 18-49 anos de idade de baixa renda. Os temas relativos às necessidades femininas no planejamento familiar compreenderam os elementos constituintes das múltiplas dimensões do acesso aos serviços de saúde. As condições financeiras, relações de gênero, religião, concepções e práticas da rede informal de apoio condicionam as decisões reprodutivas. A proximidade dos serviços públicos de saúde é considerada um facilitador do acesso, as relações de gênero podem restringir a mobilidade feminina e existe carência de transporte público. Um aspecto marcante é a referência generalizada às limitações organizacionais na atenção ao planejamento familiar: número de serviços e profissionais de saúde, horário de funcionamento, organização da demanda, infraestrutura física, despreparo dos profissionais, falta de alternativas e periodicidade da dispensação de métodos. A insatisfação com os recursos de saúde mostra a inadequação entre a oferta e a demanda, com os serviços públicos percebidos como mais deficitários. Reivindicam recursos de saúde considerados facilitadores do acesso masculino e o gênero do profissional afeta a atenção. O custo da aquisição leva a suprimir o uso ou descontinuar o método. A disponibilidade de seguro de saúde reduz os custos. Não mencionam gastos com transporte. Não há referência ao exame físico e à anamnese. A baixa receptividade e a descortesia restringem a comunicação. Em quase todos os estudos, há mulheres que não receberam informação relativa aos métodos contraceptivos. Elas querem ser informadas, principalmente, sobre efeitos colaterais e variedade de métodos. Sentem carência de aconselhamento e comunicação dialógica e desejam contar com suporte profissional na negociação do método pelo casal. Subtemas como custos da prestação de cuidados e do tratamento dos efeitos colaterais estão ausentes das interpretações secundárias. Algumas interpretações de segunda ordem apresentaram diferenças de perspectiva em relação ao percebido pelas mulheres: predomínio de visão negativa sobre influência da rede informal e prática educativa desenvolvida para combater equívocos. Conclusões: Para assegurar a decisão informada no planejamento familiar é fundamental criar condições organizacionais para acesso equitativo e desenvolvimento de atenção baseada na excelência técnica e sensível às necessidades e perspectivas dos indivíduos. Os serviços de saúde devem se estruturar para acolher, também, as necessidades masculinas e capacitar os profissionais para atuar como mediadores da equidade de gênero no planejamento familiar.