Prevalência de anemia em gestantes, fatores associados e desfechos perinatais de acordo com dois critérios de avaliação (OMS versus CDC)

Abstract

Introdução: a anemia é, por sua magnitude, o principal problema carencial do mundo, e devido as modificações corporais e metabólicas próprias da gravidez, as gestantes apresentam vulnerabilidade peculiar para alterações hematológicas, compondo os grupos de maiores riscos populacionais. Apesar do diagnóstico laboratorial comum da anemia, os limiares de hemoglobina estabelecidos para sua definição em gestantes ainda são questionados. Objetivo: determinar a prevalência de anemia em gestantes, os fatores associados e desfechos perinatais de acordo com dois critérios de avaliação (Organização Mundial de Saúde - OMS e Center for Disease Control and Prevention - CDC). Métodos: foi realizado estudo de corte transversal com objetivos analíticos e comparativos, utilizando o banco de dados do inquérito “Nutrição e infecção: o problema revisitado em função do surto de microcefalia”, estudo de coorte realizado com gestantes atendidas em um hospital de referência do Ministério da Saúde no Nordeste brasileiro, com coleta de dados entre abril/2017 e maio/2019. A população do estudo atual foi composta pelas gestantes do banco do estudo original que possuíam exame laboratorial de hemoglobina no 2° trimestre gestacional. A anemia foi determinada quando a concentração de hemoglobina <11g/dL pelo critério da OMS e <10,5g/dL pelo critério do CDC. A análise estatística foi realizada utilizando o software Stata 12.1. A identificação de possíveis fatores associados (biológicos, sociodemográficos, obstétricos, nutricionais e clínicos) à anemia nas gestantes de acordo com cada critério diagnóstico (OMS e CDC) foi realizada mediante o ajuste de modelos de regressão de Poisson, uni e multivariados. Para análise da associação entre desfechos perinatais (óbito perinatal, prematuridade, recém-nascido pequeno para idade gestacional, baixo peso, muito baixo peso e peso insuficiente ao nascer) e anemia segundo critérios da OMS e do CDC foi realizado teste qui-quadrado de Pearson ou, quando esse não foi adequado, o teste exato de Fisher. Para fins estatísticos foi considerado valor p < 0,05. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa. CAAE n° 26666019.3.0000.5201. Resultados: das 781 gestantes estudadas, a prevalência de anemia no segundo trimestre de gestação foi de 22,9% pela OMS, e 10,9% pelo CDC (p < 0,001). A anemia quando diagnosticada pelo critério da OMS esteve estatisticamente associada a idade entre 12 e 19 anos, mulheres com no máximo oito anos de estudo, realização de menos de seis consultas de pré-natal, gestações múltiplas e infecção pelo HIV; e quando considerado critério do CDC se associou ao estado nutricional de baixo peso. Um aumento significativo no risco de baixo peso ao nascer foi observado em filhos de gestantes anêmicas, independente do critério diagnóstico utilizado, enquanto maior risco de recém-nascido pequeno para idade gestacional foi evidenciado apenas quando anemia diagnosticada pelo critério do CDC. Conclusões: a anemia na gestação continua sendo um problema de saúde pública importante, porém sua magnitude pode estar sendo superestimada devido aos diferentes critérios de avaliação. Com o uso do critério do CDC para diagnóstico de anemia na gestação, os riscos maternos e fetais possivelmente se distribuem de forma diversa do que se presume pelo ponto fixo da OMS.